DOR MUSCULAR: UM INDICADOR DE SAÚDE
- Cris Westphal
- 25 de ago. de 2020
- 2 min de leitura
Do que fala a dor, quando se apresenta no corpo físico?
O que comunica?
A dor muscular é expressão. Expressão é sempre subjetiva. Para torná-la comunicação é preciso objetivá-la.
Ao pensarmos na dor como linguagem, a questão que se apresenta é: qual é a fala da dor muscular?
Assim como na expressão verbal, manejar os signos e códigos presentes na linguagem é que permite expressão e comunicação; decifrar a dor muscular permite ampliar a comunicação do sujeito com ele mesmo, a partir de seu corpo.
A dor muscular remete, inevitavelmente, a pessoa a uma experiência com o próprio corpo, mesmo que na pior das hipóteses seja somente para situar a queixa e escolher a terapêutica e o profissional de saúde. Conteúdos sensoriais e emocionais da história pessoal, mais ou menos inconscientes, estão sempre presentes, mas não basta estabelecer a relação psique-soma, é preciso estabelecer a relação pensamento- psique/soma. A dor muscular fala à percepção sensorial do sujeito, fala às estruturas neurais que a registram, estabelece relações sinápticas para que sejam identificadas as emoções que a dor desperta ou que já estavam lá para serem descobertas e nomeadas, chegando ao pensamento e finalmente à consciência (Damásio A. 2000).
A dificuldade na percepção sensorial da dor como algo pertencente ao sujeito e construída inconscientemente na musculatura estriada cria a primeira dissociação entre corpo e consciência (e a dor vai perdurar).
A dor muscular remete, portanto, o sujeito a resgatar a percepção sensorial (da dor e do corpo), a compreender via pensamento como ela foi criada, em paralelo à experiência de desconstrução do caminho muscular que gerou o sintoma, ganhando consciência dos gestos inconscientes e seus significados e reconstruindo conscientemente a ação muscular.
A dor muscular também remete o sujeito a perceber que “somos incapazes de impedir uma emoção; o que se consegue adquirir é a capacidade para disfarçar as manifestações externas de emoção, sem jamais poder bloquear as mudanças automáticas que ocorrem no meio interno e na musculatura estriada.
Assim a dor muscular pode ser compreendida como meio de acesso a gestos inconscientes que querem e podem emergir para consciência. Tem, portanto, uma função de prevenção, por promover o contato com a consciência de si mesmo e refazer percursos.
A dificuldade na relação sensação-emoção-pensamento não perpetua a sensação de dor, pois dispomos atualmente de recursos fisioterápicos e farmacológicos potentes para eliminar rapidamente a dor, mas o que permanece registrado no caminho neural e muscular é a intenção do gesto inconsciente, que continuará atuando enquanto a consciência não fizer seu trabalho de integração.
O conceito de saúde na visão psicossomática não se define apenas pelo que deve ser evitado, controlado, mas passa pelo que deve ser compreendido no processo saúde-doença.
A dor muscular é sintoma benigno; antes de ser eliminada precisa poder revelar o corpo, o sujeito, seu mundo interno e sua subjetividade, em sensação, emoção e linguagem. Se for eliminada sem permitir integração e consciência perde seu caráter preventivo e de promoção de saúde.
Ao comunicar a presença de um corpo que sente, tem conflitos, age, reage, pensa, lembra, esquece, sofre, se movimenta, a dor muscular é um indicador de saúde.
Concluiremos citando Le Breton, para quem “ toda dor, mesmo a mais modesta, induz a metamorfose, projeta uma dimensão inédita da existência, abre no homem uma metafísica que transtorna o ordinário de sua relação com os outros e com o mundo ” .
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